sábado, 14 de abril de 2012

Leis de ameaça

É proibido proibir!

Desconfio daqueles deputados que em nome dos cidadãos inventam leis estranhas sob a justificativa de fazer o bem para a sociedade. Existe muito parlamentar por aí querendo proibir o chope nas calçadas, o quentão nas quermesses, a cerveja nos camarotes de carnaval, o vinho nas festas de nossa senhora queropita, a caipirinha nas praias e o champanhe comemorativo da formula 1...
Estamos caminhando cada vez mais para uma sociedade purista e careta.
De vez em quando somos ameaçados por projetos leis destes nobres parlamentares que não acrescentam em nada na vida dos cidadãos. Qual seria a justificativa para tantas leis proibitivas? Será mesmo esta a alternativa, proibir?
O fato destes senhores de leis proibirem tanta coisa evidencia cada vez mais um fato, o pânico do debate público destes ofendidos que visam tomar conta do pensamento público, esmagando e passando por cima de tudo que não concordam. Ora, colocar em xeque a liberdade do cidadão baseados em leis proibitivas não adiantam nada, de uma forma ou outra, estes leis serão burlardas e as pessoas vão continuar fazendo seus atos, sejam proibidos ou não.
O problema disso tudo é o medo que estes puritanos têm da afirmação da vida para além do bem e do mal. Morrem de medo de Eros e tentam se esconder em um asylum ignorantiae inundado pelo pânico da hostilidade primitiva do mundo.
A realidade para estes senhores conservadores de leis é insuportável e a verdade apresentada nua e crua é uma ferida que os agride o âmago de seus seres. Quando tais medidas são propostas, basta verificar o horror contido no discurso, e olha que estamos escrevendo apenas alguns projetos, deixando de fora, por exemplo, a proibição do uso de estrangeirismos proposta por certo bigodudo gaúcho.  
O espírito desta classe que nos “representa” não passa de puro ressentimento, por isso, estes puritanos da ordem temem qualquer abalo em seu mundo do bem. É neste sentido que leis são criadas, trazer benefícios para aqueles que compactuam com esta visão de mundo estreita e ameaçadora. Esta bancada que se define pela moral dos bons costumes e do bem, assumem ares de moral extremamente ameaçadores, por isso, escondem-se em miúdos projetos que nada dizem.
Nobres parlamentares, ao invés de preocupar-se com estes projetos inúteis, que tal elaborar uma lei que proíbe a corrupção?  

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Absurdo

"Olhos submersos infligem regras postas, querem ser curados desta doença endêmica que aflige este coração desviante. Cegos que já não veem como antes, o ontem e o hoje estão fundidos na busca de sinais que não veem . Estes olhos, sentem que a razão da vida é absurda, são nada mais que patentes desadequadas a impressão natural do que é".

domingo, 31 de julho de 2011

Sobre amar

Amar é muito importante para qualquer desenvolvimento espiritual ou intelectual. Isto é um fato, mas como todo fato, há os que são contra e conseguem transformar este doce fardo[1] simplesmente em dor e sofrimento. Será mesmo necessário sofrer tanto para se ter amor? Evidentemente, esta postura metafísica que me faz lembrar a penosa busca de Dante a Beatriz possui fortes resquícios nos dias de hoje. Mas, quem em sã consciência se ajoelha a tais dogmas? Há pessoas que seguem a manada e não sabem sequer o destino. Dissimulados em si mesmos, não se questionam um instante e semelhante a Janus, marcam as portas de entrada e saída com o mesmo caractere, o verdadeiro e o falso.


[1] Heidegger

quinta-feira, 14 de julho de 2011

V

Desde o princípio soube destes acontecimentos, não muito claros, e às vezes escuros, tentava os entender na mais correta circunstância desaparecida. O problema foi que ao invés de encontrar, me perdi, e nada permaneceu dentro deste ser que tenta buscar alguma coisa.

Já sei! Migalhas! Migalhas ao vento!

Talvez esta seja a única resposta que eu tenha dentro de mim, mas não sei se esse eu é tão sério assim. Aquela idéia inicial, repleta de contradições e que todos reclamavam, tentei abandoná-la, mas, ela persiste em me seguir como uma sombra que não desgruda ao menos um segundo.

Saia de mim tentação! Desapareça! Deste jeito, eu não sei se eu estou neste mundo de fato, ou sou apenas uma peça nesta engrenagem enorme que engole milhões todos os dias. Este tormento, de não saber nada, e que de fato às vezes se sabe, o que parece até uma apologia da ignorância, me persegue, e aqueles que estão ao meu lado irritam-se, dizendo que tais confusões são frutos de devaneios que não faz sentido.

Ora bolas, os devaneios não fizeram sentido em muita gente? Por que raios tenho de justificar-me com o alheio? Tenho pouca coisa a oferecer, talvez, em milésimos de segundos elas se mostrem em instantes profundos, em clarões que me fazem entender aqui ou acolá como um todo dentro de mim. Estas coisas desaparecem como nuvem passageira.

Quando um dia souber ao menos aquele milésimo de segundo, verei um monte de coisas confusas e difusas, como o combate ao sofrimento, alegrias e dor. Quando encontrar-me em mim todas estas coisas, não serei mais eu, e as camadas de minha carne, as zonas de dor, os feixes sobrepostos estarão nos recônditos da incerteza de meu grito. Então, procurarei outro problema qualquer, desde que seja para iniciar novamente este ciclo repleto de feixes desfigurados neste interior.

Combaterei tudo novamente! Até as migalhas jogadas ao vento. Não sobrará nada de nada! E assim, aqueles acontecimentos serão grãos de areia desfalecendo em minhas mãos repletas de dor. Até chegar lá, outros lugares estarão abertos e novos clarões serão extensões do que vejo perante os meus olhos. É neste ponto de partida muito curioso e estranho que meu corpo se ilumina, em um doce fardo que se mistura em um monte de componentes aparentemente desconexos que deixam-me incerto de sentir a força dos sentidos das camadas de minha carne, atravessadas em zonas e feixes de dor.

Assim, corro e volto ao mesmo lugar.

*Desenho. Claudionor Rodrigues!

terça-feira, 28 de junho de 2011

“Razões do amor”

O que registro hoje de madrugada foi um apagar em uma imensa luz que se pôs em violentas pisadas vagarosas que conduziram aquela pergunta que não quis se calar. O que é o amor? Minha amada, sabendo que, a princípio não poderia dar-lhe uma resposta pronta e acabada, permaneceu em um profundo silêncio pensando que eu não a amava. No momento, a única resposta que tive a oferecer era. Amo porque te amo. Há explicações para amar? Muitos poetas mostram que no amor não há explicações. O que há então? Um sentimento tumultuado feito um tufão que desorganiza e ao mesmo tempo organiza. Certamente, estas contradições surgem aos que são tocados por ele se revelam como doce fardo. Porque então este coração que já não pede e nem apanha continua a teimar em ir a direção dele? Não há razão que explique, há apenas uma gama de contradições que me acompanha e quer ser acompanhada. Não há explicações para o amor, há apenas um profundo lançamento em direção a pessoa amada, independente do que for, mesmo que este lançar brote um sofrimento. Amo-te como um perdido, que de vez em quando tenta moderar os sentimentos, amo-te na contraditória fala repleta de tribulações, confusões de palavras e significados que me agitam. Pouco importa aos amantes os sentidos. Mesmo que este sentimento se desvele como um desejo repleto de lágrimas e tormentos, nunca cessaria esta voz que clama em dizer algo. Eu te amo! Gritaria aos ventos, pouco importa se alguém irá me ouvir, sairia correndo nas ruas feito um louco sem destino, não para provar, porque o amor não se prova, se sente e quando o sentimos, ficamos completamente tocados e embebidos por ele. Amo porque eu te amo! E porque será então que o amor se apresenta em nós como uma imensa possibilidade humana que nos faz mover mundos e montanhas em direção da pessoa amada? Por qual razão ele se explica? Haverá mesmo uma razão? E como esta bela dor de sentimento humano se revela como um dos maiores sofrimentos que uma pessoa pode ter? De fato, Romeu e Julieta, em termos de sofrimentos poderiam ajudar-me a responder, mas, os livros não explicam nada, não há razoes para o amor, se houvesse, escolheríamos milimetricamente a pessoa amada de acordo com nossos princípios morais, éticos, políticos, estéticos, e etc. Assim sendo, o amor, com alguns toques inquietos, por mais deplorável e doce que seja, mostra-se como sofrimento natural, contraditório e não suficiente para tanto.

Este doce copo de cólera, onde saudade, ausência e dor são constantes e se misturam, revelam-se como um dos maiores segredos peculiares que tantos tentaram decifrá-lo e acabaram por sofrer as conseqüências deste mistério.

O que fazer então?

Amar...

terça-feira, 17 de maio de 2011

Estribeiras porosas

XC

Não há duvida que exista alguma coisas em nós, que não sabemos o nome e que nos deixa completamente cansados das coisas que fazemos durante o dia a dia. Aquela velha conversa sobre rotina, cansaço e afins surge como um pronto socorro de vozes perdidas em meio aos caminhos que não sabemos também quais são.

Há um caminho? Não se sabe. O mais próximo parece o único e evidente.

XCI

Talvez este caminho seja a cegueira denunciada por José Saramago em Ensaio sobre a cegueira, onde o claro para aqueles que não enxergam o palmo mão tem seus destinos traçados desde a tenra infância.

XCII

Diante desta situação, se vejo uma moça passar horas num ônibus apertado e sem condições de trabalho, se vejo um ladrão roubando alguém, se vejo as mínimas condições de vida serem roubadas sem nenhum propósito, eu tenho de ser contra a este assalto dominante, não posso passar indiferente e ver que tudo está tudo bem.

XCII

Somente aqueles que detêm os privilégios de ficar sem preocupações, vivendo uma vida bucólica, parecem ter o direito de não preocupar-se com tais acontecimentos, mas, por outro lado, estes despreocupados são os mais vulneráveis para a cegueira cor de leite denunciada por Saramago. Resta saber, quem é mais cego, aquele que vê, ou aquele que finge ver?

domingo, 6 de março de 2011

Mayakovsky: Um poeta a plenos pulmões


O poeta russo Vladimir Mayakovsky (Владимир Маяковскии) que viveu a revolução bolchevique de 1917 na Rússia, foi um dos grandes poetas de seu tempo. Com versos e composições audazes, iniciou um novo modo de fazer poesia. Escreveu vários poemas para declamação pública, pondo abaixo as tradições literárias da cultura burguesa de seu tempo. Aos poucos, Mayakovsky se iniciava em um novo modo de fazer arte, vinculada ao futuro e as novidades tecnológicas surgidas na sociedade russa.

Nesta época os círculos acadêmicos eram muito comuns entre os russos, os museus e os cafés eram lugares preferidos de debate entre estes. No entanto, não foi este o caminho que o poeta fez. Juntamente com aqueles que desejavam uma nova forma de fazer arte, Mayakovsky abandonou os círculos acadêmicos para ir em direção as praças, ruas e fábricas dos grandes centros urbanos da Rússia Soviética para escrever uma nova poesia que surgia em meio às contraditórias catástrofes de guerras. Clark e Holquist[1], por exemplo, contam que Mayakovsky dormia no assoalho do telégrafo central de Moscou, de modo a estar de prontidão a elaborar cartazes sobre os acontecimentos da revolução.

Já Trotsky, possuía um olhar diferente sobre o poeta. Dizia que em Mayakovsky existia reflexos de um gênio[2] e que ele não era em primeiro lugar um revolucionário e em segundo, um poeta. Era antes de tudo, um poeta, que rejeitou as velhas formas do fazer poético, embora não por completo. Além de poeta, foi ao mesmo tempo, sujeito e vítima das transformações sociais, que, junto com o admirável desejo de se fazer uma nova sociedade e cultura, aproximou-se significativamente dos acontecimentos da insurreição.

Após a revolução de outubro de 1917, Mayakovsky e os demais membros do grupo cubo-futurista se entusiasmaram com os acontecimentos políticos da época e tomaram partido favorável a revolução. O ânimo diante dos novos fatos possuía varias razões. Juntamente com as rupturas político-sociais, surgia no horizonte um novo modo de fazer arte. É nesta época que Mayakovsky escreve “Ode a revolução” e “Marcha de esquerda”, poemas declaradamente revolucionários[3].

Em seus poemas, Mayakovsky tem como característica central o inconformismo diante do cotidiano sufocante, muito bem descrito em 1913 no poema Algum dia você poderia[4]?

Manchei o mapa quotidiano
jogando-lhe a tinta de um frasco
e mostrei oblíquas num prato
as maçãs do rosto do oceano.

Nas escamas de um peixe de estanho,
li lábios novos chamando.

E você? Poderia
algum dia
por seu turno tocar um noturno
louco na flauta dos esgotos?

Em seus versos, a metáfora, as imagens, rimas, estrofes e a incansável resistência de não se entregar a vida cotidiana, rotineira, e burocrática, mostra-se como uma constante obsessão do poeta. Foi nesta mesma linha Roman Jacobson interpretou que o suicídio de Mayakovsky já estava posto desde o início de sua poesia. Segundo o lingüista, o poeta preferiu o silêncio ao ser um mero vendedor de versos.

Com a morte de Lênin, Stalin assume o poder e estabelece uma série de regras e normas para a produção artística. Assim como o teórico Bakhtin e outros artistas que foram censurados e acusados de produzir obras subjetivas, Mayakovsky era chamado pelos burocratas Stalinistas de “incompreensível”, pois seus poemas não seguiam as diretrizes oficiais para produção artística. Ou seja, a liberdade poética tanto sonhada pelos artistas com o advento da revolução foi violentamente substituída por manuais burocráticos de conduta que eram impostos goela-abaixo aos artistas, sendo substituída aos poucos pelo realismo socialista. Na esfera política, a oposição comandada por Trotsky sofreu as mesmas conseqüências e cada dia as liberdades antes tanto desejadas, estavam cerceadas.

Mayakovsky preferiu o silêncio ao se entregar a censura oficial. Foi o que fez. Ecolheu deixar a vida em 14 de abril de 1930. Este lutador de palavras, como definiu Trotsky, deixou-nos um legado importante que se tornou inquestionavelmente percussor de um novo futuro, uma nova poesia, brotando a plenos pulmões.

Abaixo, segue o bilhete de suicídio de Mayakovsky,

A todos

De minha morte não acusem ninguém, por favor, não façam fofocas. O defunto odiava isso.

Mãe, irmãs e companheiros, me desculpem, este não é o melhor método (não recomendo a ninguém) mas não tenho saída.

Lilia, ame-me.

Ao governo: minha família são Lilia, Brik, minha mãe, minhas irmãs e Verônica Vitoldovna Polonskaia.

Caso torne a vida delas suportável, obrigado.

Os poemas inacabados entreguem aos Birk, eles saberão o que fazer.

Como dizem:

caso encerrado,

o barco do amor partiu-se na rotina.

Acertei as contas com a vida

inútil a lista

de dores,

desgraças

e magoas mútuas,

Felicidade para quem fica.

Vladimir Maiakovski


[1] Katerina Clark e Michael Holquist. Mikhail Bakhtin. p. 61

[2] Leon Trotsky. O suicídio de Maiakovski.

[3]Boris Schnnaiderman. Dossiê Maiakovski. Cronologia de Maiakovski. Disponível em http://www.apropucsp.org.br/revista/rcc01_r10.htm

[4] Vladimir Maiakovski. Poemas. Tradução de Haroldo de Campos. Ed. Tempo Brasileiro, 1967, p. 53.